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Minha vó quando nova, saia todas as manhãs para colher rosas, num campo longe de casa. Lá ela enchia o cesto de cor e se enebriava com o cheiro doce. Ela voltava para casa e toda noite soprava o fogo da lamparina. Isso acontecia todos os dias, até que ela viu ele no pomar, e como boba que era, sorriu. Sorriu, pois naquela época a maioria dos estranhos não faziam mal, ou pensavam que não faziam.
Eles se aproximaram, conversam por um bocado de tempo e sorriram infinitas vezes. Logo ela descobriu o nome dele, e ele o dela. Combinaram de se ver no dia seguinte, e assim fizeram.
Nisso tudo se passou um mês, todas as manhãs ela ia ao pomar, e além de colher rosas, sentava ao pé de uma grande árvore e conversavam horas a fio, sobre banalidades e sonhos que pareciam tão distantes. Ela dizia que queria ser professora e ele ria dizendo que seu sonho era ser músico, mesmo sabendo que aquele lance era difícil, mas disse que adorava uma prosa, depois de um forró bem coladinho, e que música significava isso para ele. No meio daquele sertão imenso, minha vó disse que também adorava o tal do forró bem coladinho, então ele a chamou para dançar. Assim, aconteceu o primeiro beijo deles dois. Não foi como os de hoje em dia, que quando cola a boca, a língua já tá lá e a mão já se perdeu em muitas curvas. Foi calmo, e singelo. Minha vó disse que naquele momento se apaixonou pelo tal Luiz Otávio, é, o povo do sertão adorava um nome composto.
Combinaram de se ver mais uma vez de noite, quando ia ter a grande festa em comemoração ao São João. Mas quando chegou em casa, se surpreendeu em encontrar seu pai junto de Barão Damião e seu filho Sebastião, é, os nomes também rimavam. Se apresentou, e ofereceu uma xícara de café, eles recusaram, muito obrigado
Sebastião a chamou até o canto da varada e perguntou se ela não gostaria de ir a festa de São João com ele, Ana olhou pelo canto do olho e viu seu pai a observando como uma clara ordem de "aceite menina", e mesmo com o coração gritando o nome de Luiz Otávio, ela aceitou. Ela sabia também, que ele estaria lá, coitada da minha vó.
O Barão Damião e seu filho foram embora, deixando Ana desesperada e com um pai perturbando a filha. Sua mãe chegou no centro e ficou enlouquecida quando soube que ela ia a festa com Sebastião, tratou logo de costurar um vestido novo. E minha vó, coitada, só sabia olhar para os lados e suspirar, pensando na aflição de encontrar Luiz Otávio. Meu Deus, o que ele acharia que ela estava fazendo?
Já tinha roído todas as unhas, quando a noite chegou. Sua mãe a empurrou para o banheiro do lado de fora da casa e ela se viu nua, jogando a água que estava na cumbuca na cabeça, queria passar o resto da noite no banheiro, mas a água no balde tinha que durar por mais três dias.
Entrou em seu quarto, passou o vestido azul sobre a cabeça, sua mãe jogou um pó branco em sua face e um batom vermelho sobre seus lábios.
Logo Sebastião chegou e foram para o baile. Logo digo que Luiz Otávio estava lá, e foi a maior confusão, com direito a briga e tudo.
Mas no fim, descobriu-se que Luiz Otávio era filho de um barão de outra cidade e foi bem mais fácil para os pais de vó Ana aceitarem o amor dos dois.
Mesmo assim, nada foi fácil. Minha vó Ana continuou querendo ser professora e Luiz Otávio querendo ser músico. Se mudaram pra São Paulo e por lá batalharam muito. Minha vó engravidou e depois de um tempo voltaram para o Ceará.
Agora posso falar, meu vô Luiz Otávio acabou desistindo da vida de música e se formou em direito, conseguindo se estabelecer em Fortaleza. Depois do primeiro filho, veio o segundo e no fim o terceiro. Minha mãe é a do meio, e eu fico feliz em saber que nos "derivamos" de um amor tão puro e que já enfrentou tanta coisa. Eles continuam juntos, se sentando toda tarde no jardim e contando histórias sobre a juventude.
E agora Analu está vindo por aí, pra conhecer as praias desse Ceará, afinal, aqui está bem longe de ser só Caatinga. E que ela descubra como é sentir a terra fofa nos pés e que se apaixone de um jeito tão inocente assim como meu avô e vó.