Se nós, nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossa pernas
Diz com que pernas eu devo seguir
(Eu te amo - Chico Buarque)

Eu me sentei para escrever, encostei as costas doloridas na cadeira e fiquei olhado para aquela página em branco por vários minutos. Nada saia. Comecei a digitar inúmeras vezes e sempre acabava deletando tudo. Precisava entregar o texto de manhã para o jornal, talvez falando sobre as novas barbaridades políticas em um tom ácido e ao mesmo tempo polido, ou da superfacilidade pregada nas redes sociais. Haviam tantos assuntos na minha cabeça e discursos montados e mesmo assim eu só conseguia pensar em você. Deitado na cama, com o corpo atravessando todo o colchão, pois você é espaçoso assim, dando espaço apenas quando me encaixo ao seu lado. As costas estavam expostas, mostrando os pequenos sinais distribuídos ali que você odiava, mesmo não conseguindo ver. Os cabelos curtinhos coloriam o travesseiro e sorri vendo o seu peito subir e descer. Então hoje, nesse meu velho espacinho no jornal que me vê falar sobre tudo e todos, decidi falar sobre você. 
Namoramos por 2 anos, mas já nos conhecíamos desde a época da faculdade, parece que aqueles anos entre corredores e provas foram tão apressados que não tivemos a chance de perceber que nos gostávamos. Mas ali nos tornamos bons amigos, sempre conversando e falando bobagens sobre assuntos aleatórios. Você era meu conforto em forma de gente, quem eu podia contar e ligar chorando quando ia mal em uma prova (sou nerd assim). Então o tempo foi passando, te vi beijando uma boca ali e aqui, me vi respondendo mensagens engraçadinhas do Instagram de outros caras e nós continuávamos ali, um do lado do outro, agindo como se já não soubéssemos que todo o descaso com o nosso coração doía. 
Foi só em uma festa, depois de quase um ano que acabamos a faculdade que nos beijamos. Você sempre foi o tipo de cara que me tirava pra dançar, não tinha vergonha das pessoas verem o seu corpo balançando, e naquela noite de novembro, eu balancei junto a você. Nossos corpos se entrelaçaram e sua boca grudou forte contra a minha, tirando todo o meu ar. A música era daquelas que não dá pra entender nada, mas ali se fez a minha preferida. Talvez naquele dia a gente tenha feito loucuras demais, se entrelaçado até criar nó. 
Assim, toda a intensidade que nos negamos virou fogo, nos queimando por completo. Por isso, depois de dias intermináveis juntos, decidimos que era hora de um ponto final. Muito mais por mim que havia virado puro caos, do que por você, que chorou enquanto eu disse que já não aguentava mais.  Amar você naquele momento me consumia, me tirava dos eixos e acabei me perdendo dentro de mim. No fim, você aceitou. Foi embora sem pensar e eu só conseguia pedir que você não dirigisse como um louco. Naquela noite eu chorei, agarrada com o travesseiro que exalava o seu cheiro. No outro dia eu contemplei tudo de bom que havíamos vivido e aceitei. Assim, ficamos 2 meses sem se ver (engraçado como o 2 nos persegue), até que hoje você bateu na minha porta. Suado, dizendo coisas atropeladas que mesmo não entendendo, me faziam chorar. Agora a saudade que me consumia, e olhar para você parado ali sem te tocar me consumiu muito mais do que o tempo que passamos distantes. Como sempre, foi tu que deu o primeiro passo, disse feito um louco que me amava e que aquilo o estava matando. Lógico que te beijei, e não foi como se estivesse voltando a vida, pois estava conseguindo viver sem você, mas foi como se as peças finalmente tivessem se encaixado novamente. 
Nos entrelaçamos novamente, embaralhados em nós, tentando andar com pernas grudadas e lábios que não se soltavam, intensos demais. Foi quando peguei no seu rosto e disse que se seguíssemos por aquele caminho iriamos nos destruir novamente. Então sentamos no tapete no meio da sala, sem se tocar, e agimos como os dois amigos que foram o conforto um do outro por muito tempo e percebemos que tínhamos que está conectados assim antes de qualquer coisa. Precisávamos conversar, rasgar o que existia de mais feio dentro do nosso peito, para que pudêssemos nos tornar puros um para o outro novamente. Depois de tanto falatório, nos entrelaçamos, mas sabendo que não deveríamos nos embaralhar e formar aquele nó que sempre acontece com os fones de ouvido. Deveríamos seguir em linhas paralelas, uma do lado da outra, na mesma direção, se cruzando, se tocando, mas nunca mais perdendo o rumo de si.

Nota: Esse texto é o efeito de sentar na frente do computador e procurar de alguma forma inspiração.Talvez por isso que tenha minhas dúvidas sobre ele. Sinto que falta textos mais "discurso" porque estamos passando por uma fase complicada no Brasil, sobretudo com a educação, mas a minha cabeça não consegue juntar as peças corretamente para trazer um trabalho legal para vocês. Enfim, espero que tenham gostado de "Consumidos por inteiro". P.S.: Essa música do Chico é sensacional!

                                                            

Deixe um comentário