1. A internet extinguiu nossa coragem.

Os relacionamentos à distância se tornarem mais fáceis por meio dela, mas tornou todos os tipos de relacionamentos mais distantes. As pessoas pedem o olho no olho mas esquecem de olhar, pedem "mais amor, por favor" mas há cada vez mais ódio impresso nos discursos de rostos anônimos - que, sabemos, não são tão anônimos assim. Estas faces representam o que nós somos em essência. Somos criados para espalhar o ódio, a intolerância com o que não concordamos ou admitimos. É muito mais fácil odiar por apenas um motivo e sustentar o sentimento do que amar e suportar as pedras jogadas pelos outros. Amar é um ato de coragem.
É preciso coragem principalmente porque, hoje, os relacionamentos não são tão levados a sério. Não se engane, tá todo mundo meio envenenado pelas redes sociais. A fachada é bonita, mas por dentro é um caos. E nas minhas mais recentes concepções, isso se equivale a nada. Não me adianta ter um texto perfeitamente estruturado sobre como a gordofobia ainda se disfarça de "brincadeira", por mais cruel que ela ainda seja, se eu continuar odiando o meu corpo e baixando a cabeça para a instituição do padrão. Não me apetece decorar dados e estatísticas escancaradas sobre como o machismo mata pessoas, em sua forte maioria mulheres, todos os dias, se eu ainda sinto medo de me posicionar como feminista enquanto eu ainda não me desconstruí acerca de muitos conservadorismos - e eu tenho tentado, já vi grandes avanços. Eu preciso de coragem para amar a mim mesma em um mundo que me criou para me odiar e procurar a perfeição, que é de conhecimento inato de todo mundo, ainda que no inconsciente, que não existe. 
Eu preciso de coragem para assumir que o meu amor, que é por mim mesma, pode sair de mim e alcançar outras pessoas. Pode sair e fazer a minha irmã, de 11 anos, entender que ela não precisa ter a barriga seca e o cabelo liso para ser bonita. Pode sair e fazer com que meu namorado não coloque relevância em conselhos não solicitados sobre a sua aparência e personalidade. Deve sair para ensinar a todo mundo o que eu venho martelando a algum tempo: a autoestima vem de dentro. Pode sair para me fazer entender que a minha bolha é bastante confortável para mim, mas eu preciso sair dela se eu quiser mudar o mundo de alguma forma. 
O mundo anda muito preocupado com as vivências dos outros. E é ainda mais preocupante, ao meu ver, que andemos condicionados neste reality show das redes sociais. É preciso coragem para se expor na internet e receber todo tipo de ódio gratuito por ser quem você é - são poucos os que se aventuram e aguentam a porrada. 
Eu não sou tão corajosa. 
Guardo o que eu tenho de bom fora desta rede infinita de falsa felicidade. Mas eu não preciso de coragem para ensinar para a minha irmã que se o garoto a maltrata na escola, não significa que ele gosta dele. Significa que ela deve se afastar dele, no mínimo. Não preciso de coragem para fortalecer a autoestima do meu namorado da forma que eu puder, mostrando o quanto ele é forte, incrível e suficiente. Não preciso de coragem para fazer coisas que farão me sentir bem sem que eu precise mudar minha estética ou até mesmo a minha personalidade. Eu só preciso me distanciar de tudo que é tóxico, envenenado, odioso. Eu preciso me distanciar dessas pessoas que cultivam o corpo padrão e mantém a estrutura de uma sociedade preconceituosa em todos os parâmetros. 
No fim das contas, talvez eu precise de um pouco de coragem para fazer tudo isso. Mas eu preciso muito mais de respeito por mim mesma para entender que não são os outros que ditarão a minha história. Eu decido como contá-la. 

Eu estou passando por uma "fase", se é que posso chamar assim, em que a vontade de sair de todas as redes sociais tem me consumido dia após dia. Excluir contas de Facebook, Instagram, Twitter e tudo mais, porque eu me sinto frequentemente entoxicada por todas elas. Mas ao mesmo tempo, me sinto hipócrita demais usando a internet para desabafar assim. É por isso, talvez, que eu não consiga me desvencilhar. Sigamos na luta.


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